Qual o sentido de usar a arte para ofender a religião dos outros?

O antigo ditado já dizia que Religião não se discute. E tem um fundamento muito forte para isso. Nossas crenças sobre os mistérios do mundo e de Deus, ou a ausência delas, são o norte que nos guia em todos os momentos da nossa vida. Ninguém pode afirmar que Jesus era definitivamente o filho direto de Deus, mesmo que a Bíblia contenha toda as provas literárias dessa narrativa, por outro lado, ninguém pode dizer que, apesar de ser escrita pelos homens, o livro sagrado seja uma mentira. E a nossa incerteza não vem nem pelo fato de que não vivenciamos a antiga época que remonta vinte séculos atrás, mas porque ainda precisamos evoluir muito para entendermos toda a verdade do complexo significado de Deus.

“É importante compreender que a nossa descrença em alguma doutrina não diminui sua importância e a verdade dentro da cultura do outro.”

Entretanto, tratar as crenças dos outros com deboche é mais do que falta de respeito. É uma afronta aos princípios de vida de qualquer um em qualquer fé. É como meter a Mãe na briga, porque envolve outros valores morais que cabem à essência de cada um, refere-se ao que uma pessoa é e àquilo que sustenta toda a sua existência. É importante compreender que a nossa descrença em alguma doutrina não diminui sua importância e a verdade dentro da cultura do outro. Por isso que, a bem da verdade, não atacamos exatamente a religião, mas uma ideia de concepção de vida, os sentimentos de amor e devoção e toda a reverência que as pessoas possuem por seus deuses. Talvez, um filme que satirize Jesus nem seja uma grave blasfêmia para os céus diante da grandiosidade de Deus, mas, para todos aqueles que têm fé, é sim. E nunca deixará de ser.

Tanto que uma simples charge brincando com Alah, levou a um ataque terrorista que vitimizou diversos trabalhadores comuns em Paris. Uma atitude totalmente condenável, que apesar de ultrapassar ao extremo a falta de respeito de uma caricatura que não matou ninguém, mostra que aquilo que para uns pode ser apenas um deboche despretensioso, para outros transtorna, faz perder a cabeça e a moral apregoada pelo seu próprio Deus. 

Porque quando se fala de religião o buraco é mais em baixo. Não só pela relação que cada um tem com seu Deus, mas pelo sagrado que envolve o mito de cada crença, o peso que a religião tem para as sociedades e para o mundo, como fonte de milagres e curas, de evitação do mal, de elevação da alma e sustentação de um povo inteiro em contraponto a um mero filme de streaming que visa entretenimento, se a gente não cair no sono antes do fim. São pesos e medidas muito diferentes, o que potencializa a falta de respeito. Aproxima-se do bullying que, para quem faz, é só uma piada de mau gosto, mas para quem sofre é uma facada no coração que leva muitos ao suicídio. Talvez, essa seja a concepção que faltou a todos aqueles que aprovaram o filme. Até porque o que não falta é tema para roteiros de cinema, para quê escolher exatamente aquele que sabem que vai ofender milhões de pessoas? Porque eles não entendem que ofender aquele que a gente quer que nos ouça é dar um tiro no pé.

Já é deselegante, quiça, falta de educação ficar ridicularizando os outros, imagina o quão desastroso pode ser debochar de suas características constitutivas, seus princípios e crenças.

Não é assim que vamos construir um mundo melhor, combater os autoritarismos e estabelecer a paz. Até porque quando a gente desrespeita, perde o respeito e não tem como exigir consideração. E essa é a base de um mundo bom, o pensamento de que se a gente quer ser respeitado em todos os campos da vida, o primeiro passo é respeitar o próximo. Isso não significa concordar ou aceitar, mas respeitar que, dentro da individualidade do outro, ele tem o direito de acreditar no que quiser e nós temos é que cuidar das nossas próprias vidas. 

E é assim que devemos agir com a satirização de Jesus. Com a elegância que não cabe a eles. Veja outro filme, mas não responda com ódio nem guarde rancor. Não é uma sátira mal educada que vai abalar o poder de Jesus de governador do nosso mundo nem a soberania de Deus no Universo. Por isso, faça o contrário, liberte-se dessa sensação negativa e entregue aos céus. A lei do retorno não debocha de ninguém, pelo contrário, é a lei mais séria que existe. 

Lembre-se do caso do construtor do Titanic, que prestes a embarcar foi questionado por uma jornalista sobre a segurança do navio e respondeu ironicamente: “Nem Deus afunda”.

O Universo tem uma surpresa para todos nós, se é boa ou ruim, vai depender de cada um.

Por: Luciano Cazz Inspirando Luz

Imagem de capa: Rodolfo Clix no Pexels






Ator e escritor. Autor do livro "A tempestade depois do arco-íris"e do blog Inspirando Luz.