Perdoar também cansa

Uma das dúvidas que nos acompanham enquanto estamos compromissados com alguém diz respeito ao perdão – o que, como, quantas vezes perdoaremos? Vale a pena? Se fôssemos levar em consideração a célebre frase do livro “Love Story”, de Jennifer Echols – “Amar é jamais ter que pedir perdão” -, como parâmetro para termos certeza dos sentimentos do parceiro, nunca conseguiríamos amar alguém, tampouco sermos amados.

Ninguém é perfeito, todos erramos, machucamos e decepcionamos as pessoas que nos amam, e vice-versa. O perdão faz parte da dinâmica de fortalecimento dos relacionamentos amorosos, pois, na maioria das vezes, traz aprendizado e mudança positiva de atitudes. Porém, ter que perdoar todos os dias os erros que se repetem e avolumam acaba por extenuar nossas forças e nossa crença na verdade daquilo tudo.

“Faz parte da conquista e do fortalecimento da união explorar o parceiro (…)”

Enquanto os parceiros se conhecem mais intimamente, no início da relação, vão se conectando mais fortemente, sentindo-se, descobrindo-se, tateando os terrenos em busca de tudo aquilo que no outro é encantador, onde se pode ou não avançar. Costumamos então atender às expectativas do amado, objetivando o mesmo em troca. Faz parte da conquista e do fortalecimento da união explorar o parceiro, sua personalidade, anseios e pontos de vista, para que o sentimento se fortaleça mais e mais.

Nessa fase em que ambos estão se conhecendo, inevitavelmente irão se decepcionar com mais frequência, pois é assim que nos impomos enquanto pessoas que pensam, agem e sentem diante das ações do parceiro. Com o passar do tempo, já sabemos bem como agradar ou desagradar nosso companheiro, ou seja, quanto mais conhecermos a pessoa que está ao nosso lado, menos teremos chances de errar em relação a ela. Infelizmente, para muitos, isso não acontece; os erros se repetem e/ou aumentam ao longo do tempo.

“(…) somente quem passa pelos acontecimentos e sofre de fato é que sabe o quanto dói (…)”

Nesses casos, teremos de encarar continuamente questionamentos sobre se vale ou não a pena perdoar tantas e tantas vezes. Muitos nos aconselharão a desistir e a partir para outra, outros pedirão que ouçamos o nosso coração e talvez haja até quem nos encoraje a tentar de novo. É muito difícil opinarmos sobre a vida dos outros, pois somente quem passa pelos acontecimentos e sofre de fato é que sabe o quanto dói, o quanto aquilo importa, o tanto de amor que ainda resta e merece ser cultivado.

Seguramente, o perdão deve sempre se acompanhar de ressalvas, não sendo concedido de forma incondicional, pois tudo o que é fácil demais não traz motivação para que reflitamos e mudemos para melhor, tampouco traz aprendizados. Da mesma forma, devemos perdoar enquanto ainda houver esperança lúcida e ponderada de que conseguiremos conviver com aquilo, sem nos atrapalhar emocionalmente. Somente perdoar enquanto ainda se carrega dentro do peito uma mágoa que teima em queimar não significa perdoar de fato, e isso certamente transbordará um dia ou outro, machucando de novo aos dois.

“É sempre bom analisarmos a forma como estamos vivendo e compartilhando nossas vidas (…)”

Ninguém fugirá às decepções com as atitudes alheias, tampouco estará livre de ter que optar entre o perdão e a renúncia a um amor por que não valha mais a pena lutar. Qualquer que seja a escolha, enfrentaremos dias de pesar e dor, pois decepcionar-se com quem amamos demais é muito difícil, sendo que muitas vezes tentamos buscar em nós mesmos a culpa pelas falhas do outro. É sempre bom analisarmos a forma como estamos vivendo e compartilhando nossas vidas, de maneira a tentarmos não nos esquecer de nosso bem estar nesse caminho, em favor da manutenção de algo que já pode ter acabado.

Trata-se daquela velha e famigerada história: ninguém perdoa ninguém sem que tenha perdoado a si próprio. Somente assim estaremos prontos para recomeçar, sem pendências, sem rancor, sozinhos ou com alguém que nos mereça de verdade. No mais, sigamos a sabedoria popular, que tão bem nos ensina a antes estarmos sós do que mal acompanhados.

Por: Prof. Marcel Camargo





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